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Biografias - Jornadas Profissionais e Pessoais

Anderson Julio Lobone
Escritor - Ghost Writer - Biógrafo - Produtor Editorial
Textos

Um amigo chamado Perseu

Durante dez anos viví no litoral do Paraná, e lá tive um doce amigo chamado de "Perseu".
Com um jeito "desmilinguido" ele bateu na porta da minha vida em uma noite chuvosa e fria, e envolto numa perigosa receita de cimento e água.

Com os olhos grudados de poeira e maresia, ele era “pele e osso”. Um protótipo perfeito de algo que havia escapado do rigoroso controle de qualidade da esmerada mãe natureza.

Minha esposa na época era mais adepta da companhia de dóceis cãezinhos, mas eu particularmente, sempre gostei mais daquele jeito independente e esnobe dos gatos, muito embora aquele bichano esquisito e mal acabado não apresentasse nenhuma das características da peculiar elegância felina.

Ainda assim, achei melhor ele passar ao menos aquela noite em nossa casa, afinal, deixá-lo na chuva seria uma crueldade. Na manhã seguinte eu o convidaria a ronronar em outras praias.
Mas qual não foi minha surpresa ao perceber que até mesmo "Schumycky" o nosso cão e "dublê de salsicha", o havia recebido com uma espantosa euforia.

- Ora bolas, esse cachorro nunca foi mesmo um exemplo de bom senso - pensei ao dormir.
Na manhã seguinte ao acordar, deparei-me com uma cena insólita: Nosso cão,
"Schumycky", estava deitado no quintal com o gato dormindo sob suas patas, como que protegido dos perigos que rondavam o quintal na madrugada..Ambos felizes da vida, como se fossem velhos amigos.

- Mas como pode isso? - perguntei-me com o meu habitual mau humor matinal.

Resolvi ignorar aquela cena comovente e sai de casa com o bichano nas mãos, afim de deixá-lo em lugar mais adequado, como por exemplo, uma casa de amparo a gatos feios, estranhos e de comportamento duvidoso.

Porém, antes mesmo de entrar no carro, ouvi "Schumycky" chorando no quintal.

Olhei para minha companheira, que com a voz embargada disse:

- Ah... deixa ele ficar. O Schumyky gostou dele.

Olhei para o bichano e não resisti a tantos apelos emocionados:

- Está bem coisa feia, você fica  - resmunguei.

Com o passar dos dias aquele monte de pele e osso se demonstrou uma grande companhia. 

Resolvemos batizá-lo de "Perseu". Isso mesmo "Perseu" sem "s".

Acho que na verdade, escolhemos esse nome porque "Schumycky" sempre levou o maior jeitão para ser "Andrômeda". Um amigo nosso chegava a dizer:

- Esse cachorro de vocês é meio "fora de freqüência". (!?)

Para a surpresa de todos, Perseu cresceu e se tornou um belíssimo gato. Acho que "Zeus" e seus parceiros do Olimpo tenham dado "uma forçinha".

Com seus pelos de tom amarelo-dourado ele andava pela casa com aquele "ar blasé" próprio dos filhos do panteão sagrado.

Tudo bem que por vezes, ele impiedosamente esbofeteava "Schumycky" pelo simples fato de estar estressado, ou talvez por não gostar do novo sabor de sua ração. 

Ele não entendia que "Perseu" ao montar em suas costas, bradava na língua dos gatos:

- Ande Pégassus... voe seu idiota!

Pobre "Schumycky. Diante de "Perseu" ele ficava maravilhado. Parecia petrificado, como se houvesse olhado fundo nos olhos de Medusa.

Tempos depois, estive as voltas com problemas de saúde que me obrigavam a ficar em casa de repouso. Naqueles dias eu observava a malemolência burguesa daquele gato.

Arrogante como poucos, ele não trocava mais do que dois "miaus" comigo durante uma tarde inteira, mas aos poucos, percebi a sua disposição de permanecer ao meu lado, todavia absolutamente "na dele".

E assim, por longo tempo, Perseu manteve-se conosco: Ignorando as visitas, surrando Schumycky, rasgando minhas meias e implicando com os vasos de plantas.

Com a gravidez de minha então companheira, resolvemos que "Schumycky" e "Perseu" deveriam nos deixar, e os entregamos aos cuidados de bons amigos.

Infelizmente, pouco tempo depois soubemos que os dois vieram a falecer, mas não sei bem se foi por alguma doença ou por saudade.

Anos mais tarde, já de volta ao Rio de Janeiro e à vida de solteiro, lembrei-me de "Perseu" e da sua infalível, providencial e excêntrica companhia.

Perguntei-me: Será que existe um"céu" para onde vão os bichos?

Fiquei a torcer para que a resposta fosse positiva.

Assim, pelo menos eu teria a certeza de que meu velho e querido amigo estaria lá em cima, andando empinado por sobre as nuvens de algodão e ignorando os outros bichos... 
Ah sim... claro, e esbofeteando o "Schumycky" .

Pobre "Schumycky"!

 

(Na foto acima, um flagrante de Perseu em um dos seus estranhos hábitos: esconder-se no alto da chaminé do vizinho em dias de chuva) - Foto: Acervo Pessoal / 2000)
Anderson Julio Lobone
Enviado por Anderson Julio Lobone em 25/01/2008
Alterado em 04/11/2008
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